GOVERNO PRETENDE ANTECIPAR COBRANÇA DO ITBI

O Imposto de Transmissão de Bens Imóveis – ITBI é um tributo municipal que incide sobre toda transmissão onerosa (não gratuita) de bens imóveis, cuja alíquota costuma variar entre 2% e 3% do valor do bem, embora o percentual máximo possa chegar até o teto de 5%. É exigido no momento em que ocorre a efetiva transferência de titularidade, que no caso dos bens imóveis, só se concretiza com o registro na matrícula perante o Cartório de Registro de Imóveis, de acordo com a redação do artigo 1.245 do Código Civil: “Art. 1.245. Transfere-se entre vivos a propriedade mediante o registro do título translativo no Registro de Imóveis. § 1º. Enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel.”

Em 2022, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a repercussão geral da questão constitucional (Tema 1.124 do STF), reafirmando o entendimento de que o fato gerador do ITBI na hipótese de cessão de direitos de compra e venda de imóvel, “somente ocorre com a efetiva transferência da propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro”.

Ao seu turno, contrariando a legislação civil e a jurisprudência do STF, o governo federal pretende alterar as regras do ITBI, ampliando o âmbito de incidência tributária, para que a cobrança seja anterior à transferência do imóvel, bastando, por exemplo, a lavratura da escritura pública, assinatura de um contrato de compra e venda de imóvel ou equivalente.

A iniciativa partiu do Ministério da Fazenda, após atender pedidos dos prefeitos, sob a justificativa de “simplificar o processo de transferência” e “agilizar a arrecadação tributária municipal”. A proposta compõe o segundo projeto de lei complementar da reforma tributária já enviada ao Congresso Nacional, possibilitando ao Fisco Municipal exigir ITBI em dois momentos distintos, embora ambos sejam anteriores à efetiva transferência por meio do registro imobiliário em cartório.

A primeira possibilidade prevê a cobrança do ITBI no momento da escritura, que é um instrumento público lavrado por tabelião que comprova o negócio jurídico, como a venda e compra de imóvel. Já a segunda possibilidade, autoriza a exigência do imposto no momento da cessão dos direitos de aquisição de um imóvel.

O município de São Paulo, por exemplo, há mais de 30 anos, exige o ITBI com a mera cessão dos direitos decorrentes do compromisso de compra e venda, cuja exação é ilegal e absolutamente questionável, acarretando judicializações de forma recorrente. Inclusive, a temática está pautada para que seja reexaminada pelo plenário do STF.

Neste contexto, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) alertou formalmente sobre o risco jurídico da proposta de alteração, notadamente, sobre a impossibilidade de se cobrar o ITBI após a mera formalização da compra e venda, sob pena de se considerar constituído o crédito tributário antes da ocorrência do fato gerador.

Sobre qualquer ótica que se analise, em ambas as hipóteses apresentadas no projeto, não se vislumbra a efetiva transferência, já que antecedem o registro na matrícula imobiliária e por isso ainda não existe a obrigação tributária.
Por esta razão, a proposta tem sido considerada verdadeiro retrocesso, pela exigência de imposto antes da ocorrência da hipótese de incidência, além da tentativa de burlar o previsto no Código Civil e no entendimento já consolidado pelos Tribunais Superiores.

Giovanna Matias de Souza Trevisan é advogada na Jorge Gomes Advogados, pós-graduada em Direito Processual Civil e pós-graduanda em Direito Tributário.