Economia do país avança, mas carrega o peso do atraso – 10/09/2010

Uma pesquisa e um índice global divulgados anteontem retrataram ao mesmo tempo os significativos avanços obtidos pela economia brasileira e os grandes obstáculos que ela tem pela frente para que possa ser mais competitiva e equânime. Os números que emergem da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo IBGE, indicam que, em 2009, um ano muito ruim para os países ricos, o Brasil prosseguiu em seu caminho de reduzir as desigualdades e melhorar, de forma geral, os indicadores de bem-estar social. Já o Índice Global de Competitividade, do Fórum Mundial de Economia, no qual o Brasil recuou duas posições, para a 58ª , mostra o peso do atraso que faz com que o país se mova vagarosamente em relação aos demais países emergentes.
A Pnad aponta a continuidade de um processo de aumento da renda dos trabalhadores e do consumo, com a diminuição da diferença entre os extremos da pirâmide salarial. Como o Brasil voltou a deslanchar depois de um primeiro trimestre ainda recessivo, há dados ruins que, no entanto, não tiram o brilho do conjunto. O desemprego aumentou, mas isso já ficou para trás – hoje ele atinge os menores índices da série histórica do IBGE. A linha da extrema pobreza recuou mais um pouco, embora em um ritmo mais lento, por dificuldades conjunturais. Nela estavam no ano passado 8,4% dos brasileiros, uma melhoria de 0,4 ponto percentual sobre o índice do ano anterior. E mesmo o aumento do desemprego, como observaram técnicos do IBGE, deu-se com estabilidade da população ocupada, isto é, a desocupação subiu porque cresceu a população economicamente ativa.
Em 2009, a renda média avançou 2,2% em relação a 2008, mas a escalada é lenta. Ela atingiu R$ 1.106 e ainda não se igualou aos R$ 1.144, seu máximo, atingido em 1996, 14 anos atrás. A curva ascendente dos menores rendimentos do trabalho, ainda que interrompida na faixa dos 10% mais pobres em 2009, resultou no encurtamento das diferenças entre os extremos salariais. O índice de Gini, que mede o grau de desigualdade, mostra, de 2004 até o ano passado, um contínuo recuo. Ele saiu de 0,559 (quanto mais próximo a um, maior a desigualdade) para 0,524 em 2009.
Houve também seguidos avanços na formalização do trabalho, acompanhados de maior escolarização da mão de obra ocupada. Os trabalhadores com carteira assinada atingiram 59,6% dos 54,3 milhões de empregados (excluídos os empregados domésticos), com aumento de quase 5 pontos percentuais em relação aos 54,9% nesta condições em 2005. No ano passado, 43,1% das pessoas ocupadas tinham pelo menos o ensino médio completo, ante 33,6% em 2004.
Há déficits que não somem do dia para a noite e que podem comprometer o futuro, se ações eficazes e persistentes não forem tomadas pelos futuros governos. O analfabetismo funcional caiu, mas ainda é muito alto, de 20,3%. No Nordeste, 30,8%, ou quase um em cada três habitantes, não sabiam ler nem escrever direito. O país ainda tem 14,5 milhões de analfabetos. A situação do saneamento é um indicador relevante sobre o estado da infraestrutura em geral e, segundo o Pnad, ela conseguiu piorar entre 2008 e 2009. O número de residências ligadas à rede coletora ou com fossas sépticas recuou de 59,3% para 59,1% do total. Ou seja, mais de um terço das residências no país não tem acesso às mínimas condições de higiene indispensáveis.
Educação e infraestrutura são dois dos pontos que pesam fortemente contra o Brasil e aparecem com clareza nos índices de competitividade internacionais. No do Fórum Mundial, a qualidade do ensino primário coloca o país na 127 ª posição entre os 139 países analisados. A qualidade em matemática e ciências foi igualmente ruim. A infraestrutura (em geral) brasileira está na 83ª posição e a situação dos portos, no 123º lugar) .
O Brasil sofre o peso do atraso na gestão pública. Rouba-se muito, não há a mínima confiança nos políticos e o desperdício nas despesas do governo só é menor que a de três países entre os 139 do ranking. O Brasil conseguiu ser o pior de todos tanto no peso da regulação do governo quanto na extensão e peso da tributação. E está entre os piores do mundo no tempo gasto para abrir um negócio, na rigidez do mercado de trabalho e no custo da violência para os negócios. Não há como avançar muito sem atacar estes pontos, que até agora têm passado longe do debate eleitoral.

Fonte: Valor Econômico