A POSSÍVEL INCONSTITUCIONALIDADE NO JULGAMENTO DO TEMA N° 1237/STJ

O julgamento do Tema n° 1237 pelo Superior Tribunal de Justiça, sob o rito de Recursos Repetitivos, trouxe entendimento desfavorável ao Contribuinte. Afinal, foi proferida decisão pela legitimidade na inclusão de valores de juros, calculados pela taxa SELIC ou outros índices, recebidos em face de repetição de indébito tributário, na devolução de depósitos judiciais ou nos pagamentos efetuados decorrentes de obrigações contratuais em atraso.

Porém, considerando o conceito de receita e faturamento, referido entendimento pode ser dotado de inconstitucionalidade.

Em casos práticos, os eventos costumam se desenvolver da seguinte forma.

O Contribuinte realiza o pagamento de valores relativos à tributos em escala maior do que à devida ao Fisco, isto é, o ente público arrecada montantes maiores do que o permitido, configurando prática contrária as definições da Constituição Federal quanto ao devido recolhimento dos tributos, considerando o fato gerador e base de cálculo adequados.

Em seguida, após o reconhecimento do indébito tributários (valor pago a mais), que ocorre após eventual lapso temporal, o Contribuinte solicita a restituição dos tributos pagos, ou seja, sua devolução.

Em vista da passagem do tempo, referidos valores são acrescidos de correção monetária que permite a recomposição da moeda. Nesse sentido, para evitar a desvalorização dos valores pagos a maior, emprega-se a taxa SELIC para que a moeda tenha no momento da restituição, o montante reajustado para preservar o poder aquisitivo da moeda e blindar o Contribuinte do prejuízo que sofreria com a depreciação dos valores, em virtude da passagem do tempo.

E justamente nesses casos, o Superior Tribunal de Justiça proferiu entendimento determinando que os valores desses juros, que buscam manter o poder de compra do contribuinte, integram a base de cálculo das contribuições da PIS e da COFINS. Ora, a Fazenda recebe valor indevido, permanece em posse do referido, é reconhecida a necessidade de devolução de tais valores após determinado período de tempo, e então a Fazenda realiza a devolução e tributação dos valores que estavam indevidamente em sua posse.

Ainda, há o evento da realização de depósito judicial, qual seja o depósito de quantias monetárias em juízo, e no momento de sua devolução ao Contribuinte, por dar causa à sua inexigibilidade pelo Fisco, os valores são acrescidos de correção monetária para recompor os valores dispendidos, até então não disponíveis ao Contribuinte, e tributados pela Fazenda.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça atribuiu à correção monetária dos indébitos tributários e depósitos judiciais a classificação de recuperações ou devoluções de custos, assim incluindo-os na quantificação de Receita Bruta Operacional, conforme o art. 44, inciso III da Lei nº 4.506/64.

Nota-se que a decisão se refugiou em dispositivo legal para definir o entendimento da incidência de PIS e COFINS sobre os valores da SELIC constantes na repetição de indébito tributário, na devolução de depósitos judiciais ou nos pagamentos efetuados decorrentes de obrigações contratuais em atraso, nos termos da redação da tese definida pelo STJ.

No entanto, considerando o conceito de receita e faturamento definido na Constituição Federal e reafirmado por ocasião do julgamento do Tema 69, referido entendimento pode padecer de inconstitucionalidade.

Nos recursos apresentados ao STJ, e que foram tomados sob o rito de Recursos Repetitivos para uniformizar as decisões, a taxa SELIC é apresentada como instrumento indenizatório pelos Contribuintes, em função de meramente recompor a redução patrimonial. Afinal, os valores pagos se encontram fora do alcance do Contribuinte e demonstram efetivo prejuízo, haja vista a ilicitude da Fazenda receber o pagamento e mantê-lo em sua posse.

Ora, a restituição dos indébitos ou devolução dos depósitos judiciais não configuram receita ou faturamento, ainda menos a correção monetária dos referidos, afinal, sua inexistência traria óbvios prejuízos ao Contribuinte. Não há margem para observar um crédito ou ingresso financeiro novo, os institutos em tela são, respectivamente, a devolução de valores de titularidade do contribuinte à sua posse.

Nesta toada, mister afastar o entendimento de receita sobre tais quantias, considerando os termos do art. 195, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal. Afinal, receita se trata de um acréscimo novo, positivo e de caráter definitivo, assim incrementando o patrimônio total. Em outras palavras, o conceito de receita empregado pela

Constituição Federal é definido pelo valor financeiro adquirido em decorrência do exercício das atividades empresariais/societárias.

Sob outro ponto de vista, não há lógica em arguir a tributação dos acréscimos tratados. Conforme o art. 2º do Ato

Declaratório Interpretativo SRF n° 25, de autoria da Receita Federal, não há incidência de PIS e COFINS sobre os valores pagos indevidamente à Fazenda, recuperados pelo Contribuinte. Assim, observando que o indébito é de propriedade do Contribuinte, é contraditório afirmar que a atualização monetária sobre tais valores é passível de tributação. Inclusive, referido entendimento da Receita Federal, somente contribui para o afastamento do caráter de receita empregado pelos julgadores, ora, os acréscimos não se tratam de novo valor decorrente da atividade empresarial, mas sim da devolução de quantias indevidamente obtidas.

Observando afrontas ao conceito de renda, delimitado no art. 195, inciso I, alínea “b”, da Constituição Federal, é possível entender pela inconstitucionalidade da decisão nos casos atinentes à restituição de indébitos tributários e devolução dos valores dispendidos a título de depósito judicial. Dessa forma, ainda resta margem de discussão dos recursos, em sede do Supremo Tribunal Federal, para analisar a constitucionalidade da aplicação o art. 44, inciso III da Lei nº 4.506/64, aos casos em tela.

A Jorge Gomes Advogados, especializada em contencioso tributário permanece à disposição para esclarecer eventuais dúvidas relacionadas ao tema.

FILIPE SARAIVA DOS SANTOS é estagiário da Jorge Gomes Advogados e bacharelando em Direito pelo Centro Universitário Antônio Eufrásio de Toledo de Presidente Prudente.