Solução de Consulta nº 90 da Coordenação-Geral de Tributação marca mudança de interpretação do Fisco.
A Receita Federal autoriza o aproveitamento de créditos de PIS e Cofins sobre frete contratado para o transporte de insumos vendidos com alíquota zero. O entendimento consta na Solução de Consulta nº 90 da Coordenação-Geral de Tributação (Cosit), que orienta a fiscalização do país.
A solução de consulta marca uma mudança de interpretação da Receita Federal a respeito do assunto. Segue a jurisprudência consolidada do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf).
Segundo o texto, os valores de frete e seguro “são considerados serviços utilizados como insumos à produção ou à prestação de serviços”. Dessa forma, diz a Cosit, dão direito ao crédito das contribuições sociais.
O Carf já compreendia assim o assunto, desde junho de 2024, quando a 3ª Turma do Conselho Superior aprovou a Súmula nº 188. Ela afirma que “é permitido o aproveitamento de créditos sobre as despesas com serviços de fretes na aquisição de insumos não onerados pela contribuição para o PIS/Pasep e pela Cofins não cumulativas”, desde que o serviço tenha sido tributado.
Os três acórdãos tomados como paradigmas para a edição da súmula são de autuações direcionadas a empresas do agronegócio, que deve ser o setor mais beneficiado pelo entendimento, por ter muitos insumos desonerados. Mas todo o setor produtivo, pode se beneficiar.
No cerne das discussões está o artigo 3º, parágrafo 2º, inciso II, da Lei nº 10.833/2003 e a Lei nº 10.637/2003. O dispositivo estabelece que bens ou serviços não sujeitos ao pagamento das contribuições sociais não dão direito a créditos de PIS e Cofins.
A Receita, historicamente, afirmava que o regime jurídico do frete acompanhava o do produto. Significava que, se a mercadoria tinha alíquota zero, não era possível aproveitar o crédito do frete, mesmo que ele fosse tributado.
A situação começou a mudar no ano de 2018, quando o Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu, no Tema 779, que o insumo deve ser conceituado conforme a essencialidade ou relevância de um determinado bem ou serviço para a atividade econômica da empresa. Esse entendimento abriu a possibilidade de o frete ser considerado um elemento autônomo para fins de creditamento.
Foi exatamente essa a conclusão da 2ª Turma do Câmara Superior do Carf ao julgar o recurso de uma cooperativa agroindustrial no ano de 2023 e assentar que “o frete pago para o transporte de insumos não onerados pelo PIS e pela Cofins é uma operação autônoma em relação à aquisição destes insumos”. Portanto, segundo o colegiado, “os fretes para transporte de insumos que não sofrem a tributação do PIS e da Cofins geram direito ao crédito de não cumulatividade” (processo nº 10925.901060/2011-34).
A solução de consulta da Receita, para especialistas, traz mais segurança ao tema, por “fechar o círculo” da jurisprudência que já vinha se consolidando. “Não era bom a Receita, apesar de haver súmula do Carf, ter a possibilidade de continuar autuando por não ter atualizado as normas. Com a uniformização do entendimento, o contribuinte não corre mais risco”.
Apesar dessa segurança, a norma trata apenas de um tipo específico de frete, em um único momento da cadeia de produção. Outras discussões permanecem em aberto, tanto no âmbito administrativo quanto judicial.
Para o transporte entre estabelecimentos de produtos acabados ainda existe controvérsia. O Carf tem posicionamento desfavorável ao contribuinte, resumido na Súmula nº 217. O texto diz que “os gastos com fretes relativos ao transporte de produtos acabados entre estabelecimentos da empresa não geram créditos de contribuição para o PIS/Pasep e de Cofins não cumulativas”.
No caso dos produtos sujeitos ao regime monofásico (quando o tributo devido em toda a cadeia é pago de uma vez por um dos entes responsáveis), por exemplo, o STJ firmou precedente no Tema 1093 que veda a constituição de créditos de PIS e Cofins sobre componentes do custo de aquisição dos bens.
No entanto, ainda está aberta a discussão judicial para os casos em que o frete é custeado pelo vendedor, uma vez que a tese do STJ aborda o custo de “aquisição”, que é pago pelo comprador.
Por outro lado, apesar de a solução de consulta não abranger todas as possibilidades de frete, a sinalização de que o transporte pode ser tratado como elemento autônomo para o uso dos créditos é positiva e pode ser aplicada para outros casos, afirma o advogado. “O entendimento acaba sendo importante para essas outras discussões.”
Essa disputa está com os dias contados, porque o PIS e a Cofins não vão mais existir a partir do ano de 2027. Isso vai gerar uma situação, segundo ele, em que os tributos não serão mais cobrados, mas ainda vai haver extensa discussão judicial a respeito deles.
Fonte: Valor

