Regulamentação da reforma tributária: O que diz o relatório final do PLP 108 – 10/07/2024

Relatório traz contribuinte para o julgamento do IBS e tributa o VGBL

O relatório ao PLP 108/2024, que traz a segunda fase da regulamentação da reforma tributária, garante a participação dos contribuintes na última instância administrativa para julgamento do IBS e define a tributação, pelo ITCMD, dos planos de previdência Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL). Disponibilizado na noite desta segunda-feira (8/7), o texto ainda prevê, de forma opcional, que os estados tributem grandes fortunas e altera o momento de cobrança do ITBI em casos de contratos de compra e venda.

O grupo de trabalho que analisa o PLP 108, que também regulamenta o Comitê Gestor e a distribuição do IBS, afirmou que o texto está pronto para ser votado em Plenário ainda neste semestre, mas que a decisão depende do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). O deputado Mauro Benevides (PDT-CE) será o relator-geral de Plenário. Benevides é vice-líder do governo e membro do GT que analisou o projeto.

Segundo integrantes do grupo ouvidos pelo JOTA, as alterações promovidas no texto do PLP 108 pelo GT não trazem impacto arrecadatório, ou seja, não aumentam ou diminuem a arrecadação.

Na semana passada, Lira admitiu que o PLP 108 poderia ficar para o segundo semestre, para não “congestionar” a votação do PLP 68/2024. Este último trata da Lei Geral do IBS, da CBS e do Imposto Seletivo e tende a ter discussão mais complexa. A previsão é que o PLP 68 comece a ser votado em Plenário na quarta-feira (10/7).

O JOTA apurou que há um clima de insatisfação dentro do grupo que analisou o PLP 108/2024, que avalia que o projeto é mais simples de ser votado. Membros do grupo se sentiram desprestigiados diante do esforço de entregar o relatório ao mesmo tempo que o G7 — que analisa o PLP 68 — mesmo tendo recebido o texto do governo 10 dias depois.

A definição da data de votação será feita por Lira. Mas já se ventila entre deputados que manter a votação do PLP 108 no segundo semestre poderá permitir que temas muito polêmicos que não sejam aprovados dentro do PL 68/2024 possam depois ser incluídos dentro do segundo projeto.

Por outro lado, há quem defenda que as polêmicas em torno do PLP 68 ainda estão longe de serem resolvidas, e o PLP 108/2024 seria uma carta na manga para aprovar alguma coisa se não for possível votar o projeto principal.

Confira em detalhes as alterações trazidas pelo relatório ao PLP 108:

Julgamento administrativo

O relatório prevê a participação de representantes dos contribuintes na última instância de julgamento administrativo do IBS. O texto original trazia apenas a atuação de julgadores representantes das pessoas físicas e jurídicas na segunda instância administrativa, o que gerou críticas entre especialistas.

De acordo com o texto disponibilizado nesta segunda, a última instância de julgamento, responsável pela uniformização da jurisprudência em caso de entendimentos distintos na segunda instância, será composta por quatro servidores indicados pelos estados, quatro indicados pelos municípios e oito representantes dos contribuintes. O presidente, que representará os fiscos estaduais ou municipais, votará apenas em caso de empate.

Ainda de acordo com o relatório, a uniformização da jurisprudência administrativa do IBS e da CBS será realizada pelo Comitê de Harmonização das Administrações Tributárias. A instância está prevista no PLP 68/24 e será composta por representantes dos estados, municípios e da Receita Federal.

A possibilidade de criação de uma jurisprudência distinta entre CBS e IBS era uma preocupação dos contribuintes. Isso porque o julgamento administrativo do primeiro tributo ficará a cargo do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf), enquanto o IBS será analisado pela estrutura administrativa criada pelo PLP 108.

“Decidiu o Comitê de Harmonização, o Carf e a 3ª instância [para julgamento do IBS] obrigatoriamente terão que seguir aquilo que foi efetivamente harmonizado, para acabar com a briga que com certeza iria ter”, afirmou o deputado Mauro Benevides durante coletiva de imprensa nesta segunda.

Com exceção do trecho sobre a participação dos contribuintes na instância máxima, a estrutura para julgamento administrativo do IBS permanece similar ao que consta do texto original do PLP 108. O projeto prevê a criação de três instâncias. A primeira terá 27 câmaras de julgamento, integradas por representantes dos estados e municípios. A segunda contará com o mesmo número de câmaras, porém terá também representantes dos contribuintes. Por fim, a última instância, que terá a função de pacificar a jurisprudência, será composta pela Câmara Superior do IBS.

O texto apresentado nesta segunda prevê, ainda, a possibilidade de realização de sustentação oral durante o julgamento administrativo do IBS.

ITCMD sobre PGBL e VGBL

O relatório ao PLP 108/2024 incluiu a previsão de incidência do Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) sobre os planos de previdência Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL) e Vida Gerador de Benefício Livre (VGBL). Segundo o artigo 181 do projeto, as entidades de previdência, seguradoras, instituições financeiras, entre outras, são responsáveis pela retenção e pelo recolhimento do imposto na hipótese de transmissão por morte ou doação do bem ou direito sob sua administração. O contribuinte tem responsabilidade subsidiária quando as entidades não efetuarem a retenção do tributo.

A cobrança do ITCMD sobre os planos de previdência sob regime financeiro de capitalização estava prevista em uma minuta do projeto do governo que circulou em 3 de junho. A previsão, no entanto, foi retirada do texto final da proposta enviada pelo Executivo ao Congresso e reincluída agora no relatório.

Por outro lado, o relatório trouxe o que os parlamentares consideraram um “meio-termo”, para que o ITCMD incida apenas se o dinheiro ficar aplicado nos planos de previdência por menos de cinco anos. Segundo o deputado Mauro Benevides, esse prazo de cinco anos vale só para o VGBL. O deputado Pedro Campos (PSB-PE) acrescentou que, em relação ao PGBL, sempre houve incidência do ITCMD. “A gente não teve alteração em relação a isso. No VGBL, por ter o componente previdenciário e de seguro, é que já havia essa distinção de que em alguns estados não existia essa cobrança”, disse Campos. Essa distinção entre os planos, porém, não está clara no relatório apresentado nesta segunda-feira.

Mauro Benevides explicou que a regra busca atingir quem utiliza os planos de previdência em planejamento tributário para evitar a cobrança do ITCMD. “Para quem tem muito patrimônio, poupança, aplicação financeira, CDB, quando você falece, há incidência do ITCMD. Entretanto, sobretudo as pessoas de mais alta renda, conseguem fazer um planejamento tributário”, disse. “Eles trocam todas as aplicações e vão para o VGBL”, explicou.

O parlamentar lembrou que esse tema é objeto de judicialização. Está pendente de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF) o Tema 1214 (RE 1363013), que discute justamente a incidência do ITCMD sobre o VGBL e a PGBL.

ITBI sobre contrato de compra e venda

O relatório prevê que o ITBI pode ser cobrado no momento da formalização do contrato de compra e venda de um imóvel, e não apenas quando houver a transmissão da propriedade no registro de imóveis.

O texto original enviado pelo governo definia que o fato gerador do ITCMD considerava-se ocorrido “no momento da celebração do ato ou título translativo oneroso do bem imóvel ou do direito real sobre bem imóvel”. Agora, o imposto poderá ser exigido “a partir da formalização do respectivo título aquisitivo translativo”, ou seja, do contrato de compra e venda. O deputado Mauro Benevides explicou que, hoje, os “contratos de gaveta” estão se avolumando e que, muitas vezes, têm o objetivo justamente de evitar a cobrança do ITBI. Segundo ele, inclusive, há municípios que aplicam uma alíquota menor no contrato de compra e venda e outra maior no registro, para tentar coibir essa prática.

“[Com a proposta do relatório], passará a ser possível a cobrança do ITBI no contrato de compra e venda”, disse. “Resolvemos enfrentar essa questão para ver se acabamos com esses contratos de gaveta”, afirmou o parlamentar.

O deputado Pedro Campos (PSB-PE) explicou que, se o município quiser, pode continuar cobrando o ITBI apenas no momento do registro do imóvel. Ele afirmou que a regra não poderá ser aplicada a contratos de compra e venda assinados antes da nova legislação.

Grandes fortunas

O texto prevê a tributação, pelo ITCMD, dos “grandes patrimônios”. De acordo com o relatório ao PLP 108, caberá aos estados e ao Distrito Federal realizar essa definição, porém, nestes casos, será aplicada a alíquota máxima do tributo, que hoje é de 8%.

Não há previsão, no relatório, do que ocorrerá caso os estados não implementem a alteração, o que acaba fazendo com que a medida seja opcional. Segundo o deputado Ivan Valente (PSOL-SP), essa disposição poderia ser considerada inconstitucional.

Para os parlamentares, entretanto, o dispositivo gerará uma “pressão” para implementação da mudança pelos estados. “Vamos ver se isso, pelo menos, sirva de estímulo para que um novo conceito de incidência sobre o patrimônio seja gerado com a reforma tributária”, afirmou durante a coletiva o deputado Mauro Benevides Filho.

Créditos de ICMS

O novo texto traz uma alteração positiva aos contribuintes em relação ao tratamento a ser dado a créditos de ICMS apropriados e não compensados ou utilizados pela empresa até 31 de dezembro de 2032. É reduzido de 24 para 12 meses o prazo para que os Estados e o Distrito Federal se manifestem sobre pedidos de homologação feitos pelos contribuintes nestes casos.

De acordo com o PLP, no caso de eventuais créditos não compensados, a empresa deverá, em até cinco anos contados a partir de 1º de janeiro de 2023, realizar um pedido de homologação, para então realizar a compensação, o ressarcimento ou a transferência dos valores.

Multas

O relatório prevê a redução de multas a contribuintes que fizerem parte de programas de conformidade instituídos pelo Comitê Gestor. Segundo o texto divulgado, a disposição segue o “espírito de que é necessário reforçar a noção do ‘fisco amigável’”.

De acordo com o artigo 60 do parecer, para esses contribuintes as penalidades pelo descumprimento de obrigações principais e acessórias sofrerão redução de 60% quando houver o pagamento integral do crédito tributário no prazo previsto para apresentação de impugnação administrativa. Caso a quitação aconteça após o prazo para impugnação, mas antes da inscrição em dívida ativa, a redução será de 35%.

Aumento do prazo para cobrança

Atendendo a pedido dos estados e municípios, o relatório estende o prazo para a cobrança administrativa de débitos relacionados ao IBS. O texto apresentado nesta segunda prevê que o regulamento do IBS “definirá o prazo máximo para a realização das atividades de cobrança administrativa, desde que não superior a doze meses, contados da constituição definitiva do crédito tributário”. O prazo original era de 180 dias.

Além disso, Mauro Benevides destacou que o relatório traz previsão para que seja instituído um teto remuneratório para o plano de vantagens remuneratórias e indenizatórias dos servidores cedidos ao Comitê Gestor do IBS. “Estamos estabelecendo um teto remuneratório, um valor máximo que com certeza será o teto do Supremo Tribunal Federal (STF)”, disse o parlamentar.

Fonte: JOTA