Tribunal reduz valor de imposto sobre doação de cotas de holding familiar – 20/08/2024

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) reduziu a base de cálculo do ITCMD em uma doação de cotas de sociedade fechada. Por maioria, a 9ª Câmara de Direito Público adotou o valor patrimonial contábil de uma holding familiar, e não o venal ou o de mercado, como defendia a Fazenda paulista, o que aumentaria o valor do imposto em quase R$ 200 mil.

A operação envolve doação de cotas de filhas para um pai, em abril de 2023. A peculiaridade é que a holding tinha patrimônio líquido (diferença entre ativos e passivos) de R$ 4 milhões, menor que o capital social, de R$ 6 milhões, o que impediu o recolhimento do tributo no sistema da Secretaria da Fazenda e Planejamento do Estado de São Paulo (Sefaz-SP). Por isso, o patriarca entrou com o mandado de segurança para conseguir pagar o imposto usando o valor patrimonial como base de cálculo.

O precedente é importante, segundo tributaristas, e reforça a jurisprudência favorável aos contribuintes. Porém, destacam, as decisões dependem muito do caso julgado. No analisado pela 9ª Câmara de Direito Público, por exemplo, o relator, desembargador Ponte Neto, votou com a Fazenda. O contribuinte pode escolher o caminho menos oneroso”, afirma Marcelo Bolognese.

A divergência decorre das diversas interpretações a respeito da previsão legal a ser aplicada. Enquanto o Estado entende que deve ser a Constituição Federal, que institui o ITCMD e seu fato gerador, e o Código Tributário Nacional (CTN), que determina a base de cálculo, os contribuintes entendem que a Lei Estadual 10.705/2000 é que deve ser considerada nessa situação.

Na lei, redigida e posteriormente regulamentada pelo Estado de São Paulo, o artigo 9º estabelece como base para a incidência “o valor venal do bem ou direito transmitido”, assim entendido como “o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação”. Porém, no artigo 14, diz que será admitido o valor patrimonial quando as ações não forem “objeto de negociação ou não tiver sido negociado nos últimos 180 dias”. É nesse dispositivo que se agarram os contribuintes.

Para o desembargador escolhido para relatar o acórdão, Décio Notarangeli, não há “menção expressa no ordenamento jurídico referente ao conceito de valor patrimonial”, mas a “jurisprudência do tribunal concluiu que a base de cálculo do ITCMD é o valor patrimonial contábil líquido”. No caso, esse valor é “o produto da divisão do valor em reais do patrimônio líquido pelo número de quotas, segundo a variação da Ufesp [Unidade Fiscal do Estado de São Paulo] da data do balanço patrimonial anterior até o momento do fato gerador”, diz Notarangeli (processo nº 1015171-63.2023.8.26.0037).

Ele afastou a tese do Estado de São Paulo que busca a adoção do valor patrimonial real, fruto do “balanço de determinação”. Esse balanço, segundo Notarangeli, tem como finalidade a “reavaliação dos ativos e a conferência dos lançamentos”, mas não tem repercussões tributárias. “O que o Fisco pretende não tem respaldo na lei tributária em sentido estrito”, afirma o desembargador. Ele ainda diz que, no caso, “não se trata de doação direta de bens imóveis e móveis integrantes do ativo imobilizado, mas apenas de transmissão de cotas societárias”.

No voto, também cita precedentes do TJSP, que vem adotando esse entendimento desde 2022, nas 8ª, 9ª, 10ª e 13ª Câmaras de Direito Público (processos nº 1000481-49.2023.8.26.0483 e nº 1005713-45.2023.8.26.0482).

Em nota ao Valor, a Procuradoria Geral do Estado (PGE) disse que o acórdão do TJSP não foi unânime e que já interpôs embargos de declaração, ainda pendentes de julgamento. “A tese dos contribuintes contraria as disposições legais sobre a matéria (artigos 9º, parágrafo 1º, 11 e 14, parágrafos 1º e 3º, da Lei Estadual nº 10.705, de 2000, e artigo 38 do CTN)”, afirma. O órgão cita, no texto, precedentes do TJSP e do Superior Tribunal de Justiça (AREsp 2482953). A decisão do STJ mencionada, porém, não analisou o mérito do recurso, pois incidiu a Súmula 7, que veda o reexame de provas pela Corte.

Fonte: APET